quinta-feira, 19 de abril de 2012

A circulação


Nesse link com legenda em português: http://www.ted.com/talks/lang/en/wade_davis_on_endangered_cultures.html


Por Renata Daibes


O que sempre pensei era: não queria ser alguém que não circula.


Não queria ser alguém de um mundo só, de apenas uma escolha, pertencente a apenas um lugar. Queria ter experiências, ver e muitas vezes participar de universos diferentes. Saber de assuntos variados. Lógico que dentro disso tudo temos nossas preferências, um estilo musical, uma cidade, ou duas, um diretor de cinema, um bairro, um círculo de amigos, um tipo de dança, um marido pra vida toda.


Mas que as escolhas não signifiquem prisão. Que eu não me aprisione dentro do emprego que escolhi, dentro do bairro que moro. Na adolescência sempre encanava em alguma coisa, algum assunto ou banda e ficava entregue àquela paixão por tempos e tempos. Faz parte da adolescência essa identificação para a construção da personalidade. Hoje em dia o que me faz crescer é a possibilidade da descoberta.


Por que não posso me dar ao luxo de conhecer outra classe social, de pisar na areia da cidade onde não moro, de modificar meu cotidiano com escolhas diferentes?
Me irrita o discurso de discriminar a ida da periferia ao centro. Lembro bem da polêmica sobre o metrô em Higienópolis. Haveria trânsito de pessoas diferentes àquele ambiente, talvez mendigos, camelôs, que por preconceito de alguns poucos não podem pisar naquelas calçadas para não sujá-las. Acabou que a Cracolândia foi até lá, pela própria mão do governo, que não soube o que fazer com aquelas pessoas, afinal, se pensa a maior parte do tempo em uma elite que não para de consumir.


Trânsito social me anima, me empolga. Das vezes que trabalhei na periferia, eu, moradora de bairro classe média do centro da cidade, me encantava. As crianças brincando na rua, transitando pra lá e pra cá, diferenças culturais, outras músicas, outros nomes, outro olhar sobre as coisas e pessoas. Nem tudo são flores nem de um lado nem de outro, mas o gostoso é experienciar.


Quando o poder aquisitivo me permitir, farei mais viagens do que o normal, e não, não pretendo ir apenas para os EUA ou para o Velho Mundo, quero conhecer países da África, Ásia e o que mais tiver oportunidade.


Não sou uma pessoa totalmente adaptável ao ambiente, não sou exatamente isso que sonho, preciso de um certo conforto e não me considero aventureira, mas sim curiosa. Não quero viajar para apenas ver o mundo tal qual ele se parece todos os dias, capitalista e ocidental. Quero descobrir coisas que não conheço.


Quem sabe um dia eu não chegue à pontinha do dedo do antropólogo Wade Davis. E descubra novas culturas?

4 comentários:

  1. Na primeira frase o arrepio.
    Fui lendo, e os arrepios continuaram.
    Arrepios..
    Arrepios de identificação.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Cada parágrafo tem várias repercussões, várias coisas a dizer. Nem preciso falar como isso é importante em um texto, notadamente em um texto com o teor do que você expressou. De fato, circular, literalmente e em metáfora, é indispensável para não cairmos na simplificação dos fenômenos. Em outras palavras, para treinar o olhar e blindá-lo dos reducionismos sempre à espreita para dar o bote.

    Torço para que você consiga dar vazão a esse moinho. Requer muita energia, mas vale a pena. Sobre conhecer, comparar, ponderar, sobretudo no aspeto cultural, são verbos difíceis, mutantes, porém que fazem a vida exuberante. Imagino que, até mais do que entrar em contato com outras culturas e realidades, a essência da questão é não perder de vista a inviolabilidade da diferença entre elas. Diferença não com sinais de positivo e negativo, progresso e atraso, civilização e barbárie, todas essas dicotomias que inflamam funestos discursos políticos há tantos séculos. Diferença, ao contrário, que nos iguala, como seres humanos, na reciprocidade da tolerância e do respeito.

    Allan

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    1. Exatamente, Allan. Buscar conhecer nas diferenças o que nos une, quais as características que nos tornam "iguais", e a beleza em ver como outros grupos viveram de forma tão distinta durante esses anos.
      Obrigada!! :)
      Beijos,

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