segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Meu primeiro ménage a trois foi assim...



Por Vanessa Hassegawa

Cedo ou tarde eu preciso conhecer pessoas e coisas. Conheci o trabalho de Gerald Thomas este ano, com meus ansiosos vinte e poucos anos, mas não vou refletir muito sobre isso remoendo o porquê de eu ter demorado tanto para encontrar no meio de tanto pêlo e nó do mundo o trabalho de Gerald.

Acabei de assistir sua nova obra, Gargólios, e fiquei extasiada pela quantidade de palavras, sons e texturas sobre o palco.

Tudo positivamente solto, demandas sonoras de palavras e expressões atuais como  iPods, iPads, Apple, Sony, etnias que transformam a cidade grande... tudo largado e arrematado com uma única e profunda certeza: toda a bagunça sintetiza a vida (ao menos para mim).

Não escrevo somente para mostrar a forma que compreendi os símbolos, signos daquele trabalho, até porque para atingir a conceitos e fontes faltam-me mil livros e referências... Posso apenas expor o que senti depois daquela peça (ou a não-peça).

Na cena, interferências do próprio Gerald, que tocava seu baixo sob os acordes de Led Zepelin, a cenografia de escombros, a poeira e um sangue molhado e sombrio que escorria do corpo nu de uma das atrizes, pendurada no centro do palco. Com uma prontidão e tônus incrível, ela ali estática aclamando num silêncio barulhento todos os gritos que ecoam diariamente nessa televisão que não para de balbuciar sangue, morte, estupros, vendas, carne, tudo com pouco tato.

Não me contive e, ao final da peça, comprei o livro com as crônicas que Gerald blogou de 2004 a 2010. Fui com minha grande amiga Sá, super fã do trabalho do cara.  Ficamos numa fila cheia de tietes para conseguir o autografo – e o artista lá sentado, irritadiço e ansioso – para talvez ficar com ele mesmo e entender o efeito daquele dia de sua encenação. Ele pegou nosso livro e dissemos que queríamos a dedicatória para as duas e ele disse:  - ótimo já que são duas em um posso fazer um ménage a trois com vocês sem problemas né?

Rimos envergonhadas e acho que, apesar da inadequação, felizes por ter tido naquele dia uma piadinha de um cara que modificou as impressões sobre meus outros dias. Só sei que voltar ao trabalho no escritório na semana seguinte foi conflituoso. Estive enlouquecida com pensamentos contraditórios sobre o quão abusivo da minha parte por me sentir na cena de Gargólios todos os dias, por reconhecer as personagens da peça no dia a dia. Me percebi nesse núcleo do Sistema, me reconheci também pensando sobre o mundo corporativo e a crítica feita sobre esse universo, sobre o Eugenismo vindo das declarações de colegas de trabalho, sobre a minha identidade perdida ou não perdida ou, sobre a qual mundo quero pertencer? Mas peralá: há outro para mim, há outro para Gerald Thomas? Qual o veredicto justo desse mundo em que precisamos do dinheiro do Sistema para pagar aluguel, comprar coisas e cenouras e TAMBÉM assistirmos a obras como a de Thomas – a consequência é que produzimos pensamentos. Putz, tô pensando, que merda é essa?!

Dentro de minha terrível bagunça interna, cito a própria passagem por quem me fez pensar; no programa de Gargólios: “... ou um ‘caos sobre o caos’. Mas o transformei numa clínica psicanalítica onde os heróis e super demagogos se sentem traídos pelo próprio ego sentidos com tantos ipods, tantos ipads e tantos iphones (aliás escrevo esse release num iPad, ouvindo música pelo iPod. Hummmm, que estranho. Será que virarei um download?)

É, meu caro, e é nessa imperfeição que te considero hoje uma influência que preciso explorar. Correr atrás de suas fontes na psicanálise, a bagunça de Beckett, meu ménage a trois não será sexual, mas espero daqui pra frente procurar cada vez mais entender o lado trois/ em tríade entre mim – o caos do mundo – e a poesia.

4 comentários:

  1. AINDA BEM que esse ménage a trois não foi sexual!!!! eu ia matar esse Geraldo! Amorzim, amei o texto

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  2. Esse Gerald é um fanfarrão. Não pelas suas conotações lítero-sexuais, mas pelo que faz com nossa cabeça com suas pirações.
    Muitos textos e sucesso no blog, Van!!
    Bjs

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  3. Eu que não sou muito fão do cara fiquei com vontade de assistir o espetáculo depois de ler o texto... show de texto!!!

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  4. Cabocas queridas,

    Mas que caboquice mais bacana este blog de vocês duas.
    Tem uma postagem lá no Espaço Aberto, apresentando o "Las Caboclas".
    Sucesso e muitos acessos.
    E tomara que esta rima seja uma solução.Hehehe.
    Abs.

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